O vinho na Bíblia: consumir álcool é pecado, ou apenas a embriaguez é proibida?
Quando o assunto é vinho e bebidas alcoólicas, muitas dúvidas surgem entre cristãos: afinal, a Bíblia proíbe o consumo ou apenas a embriaguez? Será que o vinho da época de Jesus era igual ao vinho de hoje? É verdade que existe recomendação bíblica para o uso medicinal do vinho? Neste artigo, você vai aprender como o vinho era produzido, conservado e consumido na antiguidade, e o que a Palavra de Deus realmente ensina sobre o consumo de bebida alcóolica.
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Sempre recebo perguntas de amigos e alunos sobre o consumo do álcool ser pecado, ou se apenas a embriaguez o é.
Pensando em facilitar a compreensão de todos que têm essa e outras dúvidas sobre o tema, preparei esse artigo e espero te ajudar a compreender o que a Bíblia nos ensina sobre o tema.
Vou listar aqui as dúvidas mais comuns e respondê-las, ok? Vamos para a primeira dúvida MUITO comum:
1ª) Jesus Bebeu vinho com Álcool?
Jesus pode sim ter consumido vinho fermentado. Porém existe uma diferença entre a bebida daquela época e a de hoje. Embora o vinho no tempo de Jesus contivesse álcool, ele era mais fraco do que o das bebidas alcoólicas atuais.
Isso porque o vinho nos tempos bíblicos era muito diferente do vinho industrializado que conhecemos hoje. Ele era mais leve, muitas vezes diluído ou fervido, e utilizado principalmente como parte da alimentação e das festas.
Vale ressaltar que a técnica de destilação, que é usada para produzir bebidas com alto teor alcoólico (como uísque, vodca e cachaça), só começou a ser desenvolvida séculos depois, na Idade Média, pelos árabes e europeus.
A fermentação naquela época não tinha o objetivo principal de produzir bebidas alcoólicas para embriaguez, mas sim de conservar o suco de uva e torná-lo uma opção mais segura para consumo por não haver forma de refrigeração.
O processo fermentativo gera álcool, que atua como um conservante natural, inibindo a proliferação de bactérias e prolongando a durabilidade da bebida.
Na Bíblia, existem dois termos principais para se referir ao vinho:
Tirosh (em hebraico תִּירוֹשׁ) — Suco de uva fresco ou vinho novo, geralmente usado como não fermentado (não alcóolico). Apesar que em Oseias 4.11 fica claro que, tanto o vinho tirosh como o Yain, podem ser intoxicantes.
Yayin (em hebraico יַיִן) — Palavra usada para se referir à uva fermentada (alcóolico). Vinho em geral, ou seja, não fazia distinção clara entre fermentado ou não, então o contexto sempre é quem define se falamos de bebida alcoólica ou apenas do suco processado.
O vinho era produzido de maneira simples e artesanal:
As uvas eram colhidas e levadas ao lagar, onde eram pisadas para extrair o suco, chamado de mosto.
Esse mosto, quando deixado ao ar livre, entrava naturalmente em fermentação devido às leveduras presentes na casca da uva.
O vinho fermentado podia ser consumido, armazenado ou fervido para conservação.
Entendendo um pouco sobre os três tipos de processo para produção do vinho dos tempos bíblicos, os três tipos de vinho dos tempos bíblicos:
Vinho fermentado (diluído) – Na cultura judaica, grega e romana, era comum diluir o vinho com água antes de beber, reduzindo significativamente seu teor alcoólico.
Alguns escritos históricos indicam que o vinho podia ser diluído na proporção de até 3 partes de água para 1 parte de vinho, ou até mais. Isso tornava o teor alcoólico muito baixo e o tornava uma bebida segura, especialmente em regiões onde a água nem sempre era potável.
Vinho filtrado: Para melhorar o sabor e evitar que o vinho estragasse, era comum filtrar o líquido para separar resíduos sólidos como sementes e cascas. A filtragem era feita com panos de linho ou decantação (deixar o vinho repousar até que os resíduos se depositassem no fundo).
Vinho fervido: Além disso, o vinho podia ser fervido antes da fermentação terminar, criando um concentrado doce que podia ser armazenado por mais tempo sem estragar. Esse método evitava a produção de um vinho alcoólico forte e, quando diluído, era consumido de forma segura e sem risco de embriaguez.
Na antiguidade, antes da invenção da pasteurização e das técnicas modernas de refrigeração, uma maneira bastante eficiente de conservar o suco de uva era ferver o mosto logo após ser extraído.
Esse processo tinha dois efeitos principais:
Eliminação de microrganismos e inibição da fermentação — o calor matava as leveduras naturais presentes na casca da uva, impedindo que o suco se transformasse em vinho alcoólico.
Concentração e adoçamento natural — à medida que a água evaporava, o suco ficava mais doce e denso, resultando numa espécie de xarope ou mosto concentrado, chamado em alguns registros históricos de defrutum (termo romano) ou sapa.
Esse "vinho fervido" podia ser armazenado por muito mais tempo, especialmente em ânforas bem seladas, e era diluído com água antes de ser consumido — tornando-se uma bebida não alcoólica, nutritiva e segura.
Também era usado:
Em refeições diárias (principalmente para crianças ou pessoas que não podiam ou não queriam consumir álcool).
Nas festas judaicas e até possivelmente em celebrações como a Ceia do Senhor, já que o processo de fervura impedia a fermentação, mantendo o suco puro e estável.
Para conservar por longos períodos e utilizar fora da época da colheita.
Alguns estudiosos defendem que é possível que, em muitas ocasiões, o que chamavam de "vinho" no Novo Testamento não era um vinho fermentado, e sim essa bebida concentrada, diluída com água antes do consumo.
Um curiosidade histórica: existe discussão sobre a questão de alguns judeus mais ortodoxos não beberem vinho fermentado, por entenderem que o fermento é símbolo do pecado e para não correr o risco de transgredir a Lei e se embriagar.
É possível que o Senhor Jesus bebesse apenas esse vinho sem fermentação nas Ceias de Páscoa. Mas essas informações são baseadas em documentos históricos relativos não só a judeus, mas também aos gregos e romanos, e não à Bíblia.
2ª) Vinho faz bem para a saúde?
A passagem de 1Timóteo 5:23 é um texto geralmente mal interpretado – “Não continue a beber somente água; tome também um pouco de vinho, por causa do seu estômago e das suas frequentes enfermidades.”
O uso do vinho com propósitos medicinais era amplamente difundido na antiguidade. O vinho era conhecido como um remédio contra a má digestão, como um tônico e também um tratamento contra os efeitos da água impura.
A água disponível naquela época nem sempre era potável. A fermentação ajudava a criar uma alternativa segura para beber, já que o álcool gerado eliminava muitas bactérias nocivas. Por isso, até crianças e famílias inteiras podiam consumir vinho diluído com água.
Mas hoje em dia você joga no Google ou no IA e não vai ter o vinho como opção de bom remédio para má digestão nem doenças estomacais.
Sobre fazer bem para o coração, uma alimentação saudável e exercício físico trazem muito mais vantagens para o coração do que o vinho. Então nem a desculpa de que Jesus bebeu, nem que o vinho faz bem para a saúde podem ser desculpa para o crente beber. Mas a escolha é sempre sua.
Existem estudos que apontam que o vinho, especialmente o tinto, pode ter benefícios à saúde por conter antioxidantes, como o resveratrol.
Porém, especialistas deixam claro que o consumo deve ser extremamente moderado, pois o álcool em si é uma substância tóxica ao organismo quando ingerido em excesso.
Embora o vinho fosse comum na dieta bíblica, a Bíblia deixa muito claro que a embriaguez é pecado. (Efésios 5:18; Provérbios 20:1).
Além disso, como nos tempos bíblicos não existia destilação (técnica que só surgiria séculos depois), as bebidas não alcançavam altos teores alcoólicos como o whisky, a vodca ou a cachaça de hoje.
O consumo era social, controlado e frequentemente diluído, com atenção para que não houvesse abuso.
3ª) Posso beber com moderação, mas não vou divulgar. Correto?
Já ouvi líderes de algumas comunidades cristãs falarem que se pode beber com moderação, mas para evitar mal testemunho, não se deve divulgar.
Baseiam-se em Romanos 14:21: “Bom é não comer carne, nem beber vinho, nem fazer outra coisa em que teu irmão tropece.”
Tudo bem, mas a Palavra de Deus também é clara quanto à nossa responsabilidade de não pecar, e fugir das tentações, de tudo que nos possa levar a pecar.
E o álcool pode levar uma pessoa a fazer algo que não teria coragem de fazer sóbria, por exemplo, cometer algum pecado.
Jesus disse em Mateus 5.29-30: Se o seu olho direito o fizer pecar, arranque-o e lance-o fora. É melhor perder uma parte do seu corpo do que ser todo ele lançado no inferno. E, se a sua mão direita o fizer pecar, corte-a e lance-a fora. É melhor perder uma parte do seu corpo do que ir todo ele para o inferno.
Resumo: se existe algo que pode levar você a pecar, seja radical: corte o mal pela raiz.
E se você pode beber (sem moderação até) outras bebidas gostosas, então por que vai escolher exatamente uma bebida que contém álcool? Outras bebidas nem vão ser uma tentação, nem vão causar escândalo.
Os efeitos do álcool são semelhantes aos de algumas drogas ilícitas, e seu abuso pode ser tão prejudicial quanto.
4ª) A Bíblia proíbe diretamente o consumo de bebida alcóolica?
SIM! Sim? Isso mesmo, para dois tipos de pessoas:
Sacerdotes em serviço – como visto em Levítico 10:9, quando estavam no Tabernáculo, os sacerdotes eram proibidos de consumir álcool, a fim de desempenhar devidamente suas funções. Em outro artigo vamos aprender um pouco mais sobre o sacerdócio levítico.
Nazireus – os nazireus faziam voto de abstinência completa do álcool e de qualquer produto da uva. Você conhece dois, que foram chamados pelo próprio Deus, antes de nascerem: Sansão (Juízes 13:4-5) e João Batista (Lucas 1:15). Em outro momento falo mais sobre esse voto do nazireado.
5ª) Então se eu não sou de uma dessas duas classes, eu posso beber?
A Palavra é clara ao afirmar que somos separados para servir diretamente ao Senhor.
1 Pedro 2.9: Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz.
Aqui, Pedro afirma que todos os crentes são sacerdotes de Deus, assim como os sacerdotes levitas eram no Antigo Testamento. O papel do crente na Nova Aliança inclui a função sacerdotal diante de Deus. (Ap 1.6)
Agora pensa comigo: se na Antiga Aliança os sacerdotes eram proibidos de consumir bebidas alcoólicas enquanto estavam no serviço do templo, tocando nas coisas consagradas a Deus, e agora, na Nova Aliança, todos os crentes são sacerdotes espirituais, inclusive o ES habita neles, faz sentido que mantenham o mesmo padrão de santidade e abstinência, concorda?
Uma vez que somos chamados por Deus para ser santos, separados e sacerdotes de Deus, a abstinência do álcool é uma escolha sábia e coerente com a identidade que recebemos em Cristo.
NÃO EXISTE a proibição direta do consumo de álcool, mas existem princípios que devem guiar a nossa conduta.
Ei! Nós não precisamos de substâncias externas para nos alegrarmos. Efésios 5:18 diz: “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito.” - só Ele tem a verdadeira alegria que você precisa!
Agora você já sabe o que a Palavra de Deus diz, e ela é o que realmente importa. A decisão é sua.
“E nos fez reis e sacerdotes para Deus e seu Pai;
a Ele glória e poder para todo o sempre.” (Ap 1.6)
Amém!
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Fontes consultadas:
GOWER, Ralph. Novo manual de usos e costumes dos tempos bíblicos. Rio de Janeiro: CPAD, 2021.
SILVA, Rodrigo. A verdadeira Páscoa. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-GO5dI06gNs&list=WL&index=2 Acesso em 10 de abr. 2025.
VINE, E. W; UNGER, Merril F.; WHITE, William. Dicionário VINE: o significado exegético e expositivo das palavras do Antigo e do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.